Afonso o grande, rei de Aragão, príncipe o mais sábio, perguntando-se-lhe quem pensava ele que era o homem mas feliz, respondeu «aquele que em tudo se conforma com a divina vontade, e que recebe os bens e os males como se viessem das mãos de Deus» Aqueles que amam a Deus, todas as coisas concorrem para bem. (Rm 8, 28) Aqueles que amam a Deus, vivem sempre satisfeitos, porque todo o seu prazer é cumprir a divina vontade, mesmo nas coisas que lhe são desagradáveis tanto que as inquietações se mudam em deleites, pelo pensamento de que, aceitando-as voluntariamente, agradam a seu amado Senhor. «Tudo quanto acontecer ao homem justo, o não entristecerá.» (Pv 12, 21) E com efeito, que maior felicidade pode o homem experimentar, do que o cumprimento de seus desejos? Então, quando se deseja o que Deus quer, tem cada um tudo quanto deseja, pois que (exceto o pecado) tudo quanto suceder no mundo é pela vontade de Deus. Conta-se nas vidas dos padres, que certo lavrador colhia sempre maior quantidade de frutos do que os seus vizinhos, e perguntando-se-lhe o motivo, respondeu: — Que se não admirassem porque as estações andavam sempre a seu arbítrio. — Como assim? Disseram os outros; — Porque, respondeu ele, nunca desejo outro tempo senão aquele que Deus manda, e como eu quero o que Deus quer, Ele também me faz a vontade, dando-me uma boa colheita. — As almas resignadas, diz Salviano quando se sentem humilhadas, confessam a sua humilhação; quando são pobres, sofrem voluntariamente a sua pobreza; em uma palavra, resignam-se a tudo quanto lhes acontece, e por isso são sempre felizes durante a vida. Se chega o calor, o frio, ou a chuva, aquele que se conforma à vontade do Senhor, diz: «Eu desejo que haja calor, e frio, ou chuva, porque essa é a vontade de Deus» Se a pobreza, a perseguição ou doença o afligem, ou a mesma morte, ele dirá: «eu desejo ser pobre, perseguido ou doente, porque esta é a vontade de Deus. É esta a gloriosa liberdade que os filhos de Deus gozam, a qual vale mais do que todos os reinos e principados deste mundo: Esta é a sólida paz que os Santos desfrutam, que excede a toda a compreensão. E todos os prazeres sensuais, festas, banquetes, honras e mundanas gratificações são vaidade e caducidade, e, enquanto que fascinam e entretém por alguns momentos, afligem o espírito, onde só pode haver a verdadeira felicidade. Aqui exclama Salomão, depois de ter esgotado o gozo das delícias do mundo: Mas isto é também vaidade e vexação de espírito (Ecl 4, 16) O louco, diz o Espírito Santo, muda como a lua, mas o homem justo continua em seu juízo, assim como o sol. (Ecl 27, 12) O insensato, isto é, o pecador muda como a lua, hoje está no crescente, amanhã no minguante, hoje está alegre, amanhã triste, hoje meigo, amanhã furioso como um tigre; e por quê? Porque a sua felicidade depende da prosperidade e adversidade, que ele pode encontrar, e então muda conforme as circunstâncias. Mas o homem justo é como o sol sempre igual na sua serenidade, sejam os sucessos quais forem; porque a sua felicidade está na conformidade com a vontade divina, e por esta conformidade goza uma inalterável paz. «Paz na terra aos homens de boa vontade» disse o Anjo aos pastores (Lc 2, 14) E quem são estes homens de boa vontade? São aqueles que estão sempre unidos à divina vontade, a qual é sempre soberanamente boa e perfeita. Tal é a boa, aceita e perfeita vontade de Deus. (Rm 12, 2) Porque Deus não pode desejar coisa alguma, que não seja a melhor e a mais perfeita.