Igreja Católica
“Hora do Amor”: unidade e caridade em homilia inaugural do Papa Leão XIV
por Thiago Zanetti em 19/05/2025 • Você e mais 68 pessoas leram este artigo Comentar

Tempo de leitura: 6 minutos
No dia 18 de maio de 2025, diante de milhares de fiéis reunidos na Praça de São Pedro, o recém-eleito Papa Leão XIV proferiu a sua homilia inaugural como Sumo Pontífice da Igreja Católica. O discurso, marcado por um profundo tom pastoral, espiritual e teológico, revelou os pilares que devem orientar o seu pontificado: amor, unidade e serviço.
1. Contexto histórico e espiritual da homilia
A homilia foi proferida em um momento particularmente delicado para a Igreja. A recente morte do Papa Francisco deixou um sentimento de orfandade espiritual. Leão XIV reconheceu esse vazio ao mencionar a tristeza e a sensação de estar “como ovelhas sem pastor” (cf. Mt 9,36), mas também fez questão de ancorar a esperança na Ressurreição de Cristo, destacando que “o Senhor nunca abandona o seu povo”.
Essa introdução não é apenas uma referência emocional. Trata-se de uma construção teológica que legitima o novo pontificado ao mesmo tempo em que reafirma a continuidade da missão apostólica confiada a Pedro e seus sucessores.
2. O espírito do Conclave e o papel do Espírito Santo
Leão XIV narrou com humildade a dinâmica espiritual do Conclave, onde os cardeais, mesmo com “histórias diferentes e caminhos diversos”, foram harmonizados pelo Espírito Santo. Essa metáfora musical – “harmonizar os diferentes instrumentos” – reforça a ideia de sinodalidade, que foi central no pontificado anterior e que aparentemente continuará sendo um eixo importante.
Além disso, ao declarar que foi “escolhido sem mérito”, o Papa reforça a ideia de serviço e não de supremacia, de pastoreio e não de poder. Essa linguagem está em plena sintonia com os documentos da Igreja que enfatiza a colegialidade episcopal e o papel do Papa como servo dos servos de Deus.
3. Amor e unidade: os eixos da missão petrina
Um dos trechos mais densos da homilia foi aquele baseado no capítulo 21 do Evangelho de João, quando Jesus pergunta a Pedro se o ama. Leão XIV utiliza o verbo grego agapao para mostrar que o chamado ao pastoreio só pode nascer do amor incondicional de Deus.
A ideia de que Pedro é chamado a “amar mais” é uma interpretação espiritual profunda que conecta autoridade e sacrifício. O Papa não é um gestor ou líder carismático: ele é um servo ferido pelo amor de Cristo, chamado a dar a vida pelos irmãos. É a autoridade que nasce da cruz, e não do trono.
Essa perspectiva também dialoga com a frase-chave da homilia: “A Igreja de Roma preside na caridade e a sua verdadeira autoridade é a caridade de Cristo”.
4. A crítica ao poder e à propaganda religiosa
De forma firme, Leão XIV rejeitou qualquer ideia de dominação espiritual:
“Não se trata nunca de capturar os outros com a prepotência, com a propaganda religiosa ou com os meios do poder, mas trata-se sempre e apenas de amar como fez Jesus”.
Essa afirmação possui alto valor eclesiológico e catequético, especialmente num mundo marcado por polarizações e instrumentalizações da fé. O novo Papa demonstra estar atento aos perigos de um catolicismo centrado em ideologias ou estratégias de dominação cultural, afirmando o único caminho legítimo da Igreja: o amor oblativo.
5. Uma Igreja de pedras vivas e fraternidade
Inspirado nas epístolas de São Pedro, Leão XIV reforçou que todos os batizados são “pedras vivas”, chamadas a construir a Igreja na “convivência das diversidades”. Cita novamente Santo Agostinho para fundamentar que a comunhão é o critério da verdadeira pertença à Igreja.
Essa abordagem promove a eclesiologia de comunhão, tão destacada no pós-Vaticano II. A Igreja não é uma instituição hierárquica e fechada, mas um corpo vivo em que cada batizado tem uma missão e um papel. Essa visão abre espaço para o protagonismo laical e para uma Igreja sinodal, missionária e inclusiva.
6. Crítica social e compromisso com os pobres
O Papa não evitou temas sociais. Denunciou a violência, os preconceitos, o medo do diferente e o “paradigma econômico que explora os recursos da Terra e marginaliza os mais pobres”. Reafirma assim a Doutrina Social da Igreja e mostra que seu pontificado estará atento à justiça, à ecologia e à dignidade humana.
A referência à Rerum Novarum, do Papa Leão XIII, é estratégica: além de associar-se espiritualmente ao Papa do mesmo nome, ele atualiza o compromisso da Igreja com a transformação social.
7. Diálogo ecumênico e inter-religioso
Em sua visão de mundo, Leão XIV estende o convite à unidade para além das fronteiras eclesiais. Fala da caminhada conjunta com “as Igrejas cristãs irmãs”, “outros caminhos religiosos” e “todos os homens e mulheres de boa vontade”.
Essa é uma reafirmação do espírito do Nostra Aetate e do Unitatis Redintegratio, documentos conciliares que promovem o diálogo e o respeito mútuo. No cenário atual de tensões religiosas, a postura do novo Papa sinaliza abertura, escuta e promoção da paz.
A hora do amor
Leão XIV encerra sua homilia com uma poderosa convocação:
“Esta é a hora do amor!”.
Essa frase sintetiza a missão que ele propõe à Igreja para os próximos anos: uma Igreja que evangeliza com ternura, serve com coragem e promove a unidade sem anular as diferenças. O amor é apresentado como critério da fé, motor da missão e base da autoridade.

Por Thiago Zanetti
Jornalista, copywriter e escritor católico. Graduado em Jornalismo e Mestre em História Social das Relações Políticas, ambos pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). É autor dos livros Mensagens de Fé e Esperança (UICLAP, 2025), Deus é a resposta de nossas vidas (Palavra & Prece, 2012) e O Sagrado: prosas e versos (Flor & Cultura, 2012).
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