Doutrina Católica

O Pastor da Misericórdia: o legado do Papa Francisco para a Igreja

por Thiago Zanetti em 21/04/2025 • Você e mais 829 pessoas leram este artigo Comentar


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Tempo de leitura: 6 minutos

O falecimento do Papa Francisco (hoje, 21/04/2025) marca o fim de uma era profundamente significativa para a Igreja Católica e para a humanidade. Seu pontificado, iniciado em 13 de março de 2013, foi caracterizado por um vigoroso apelo à misericórdia, à paz, à justiça social e à renovação espiritual. Francisco, o primeiro papa jesuíta e o primeiro latino-americano a assumir o trono de Pedro, deixa um legado que transcende fronteiras e ecoará nas próximas gerações.

1. O Papa da Misericórdia: um pontificado moldado pelo amor

Desde sua eleição, Francisco deixou claro que sua prioridade seria a misericórdia. Em sua primeira homilia, recordou que “o verdadeiro poder é o serviço” (Homilia na Missa de Início do Pontificado. Vaticano, 19 mar. 2013), colocando no centro de seu ministério a compaixão pelos pobres, marginalizados e sofredores.

O Ano Santo da Misericórdia (2015-2016), convocado por ele, tornou-se o símbolo máximo de seu pontificado. Ao proclamar:

“Misericórdia é o nome de Deus” (Papa Francisco, Livro O Nome de Deus é Misericórdia, 2016),

O Santo Padre reafirmou que a essência do cristianismo não é a condenação, mas o amor que perdoa e salva.

2. O Papa que sonhou com uma Igreja em saída

Francisco sempre desafiou a Igreja a sair de si mesma. Em sua exortação apostólica Evangelii Gaudium (2013), lançou o apelo:

“Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças” (Evangelii Gaudium, n. 49).

Seu papado foi uma convocação à missão: uma Igreja que escuta, acolhe e acompanha, sem medo de se comprometer com as realidades humanas mais dolorosas.

3. A opção preferencial pelos pobres e a justiça social

Seguindo a inspiração de São Francisco de Assis, o Papa adotou uma postura inequívoca em favor dos pobres, dos refugiados e dos descartados pela sociedade. Ele recordou ao mundo que:

“A desigualdade é a raiz dos males sociais” (Evangelii Gaudium, n. 202).

Seus gestos concretos — visitas a favelas, centros de refugiados, prisões — e suas palavras proféticas denunciaram um sistema econômico que mata. Francisco resgatou o cerne da Doutrina Social da Igreja e lhe deu nova atualidade.

4. O cuidador da Casa Comum: A encíclica Laudato Si’

Em 2015, com a publicação da encíclica Laudato Si’, o Papa Francisco redefiniu o compromisso ecológico como uma questão de fé. Ele escreveu:

“O cuidado da natureza faz parte dum estilo de vida que implica capacidade de viver juntos e de comunhão” (Laudato Si’, n. 228).

Alertando para a urgência da crise ambiental e a responsabilidade moral dos cristãos, Francisco não apenas ecoou preocupações científicas, mas elevou a ecologia ao plano espiritual, convidando todos a uma “conversão ecológica”.

Papa Francisco tornou-se um incansável mediador em conflitos internacionais e um construtor de pontes entre religiões. Seu histórico encontro com o Patriarca Ortodoxo Bartolomeu, sua aproximação com o Islã e seu contínuo diálogo com o Judaísmo confirmaram sua visão de uma fraternidade universal.

“Ou nos salvamos todos ou não se salva ninguém.” (Papa Francisco, Fratelli Tutti, n. 137)

Sua diplomacia foi marcada pela ternura e pela esperança, em contraste com a lógica da força e da divisão.

6. A renovação espiritual e pastoral da Igreja

Francisco incentivou uma espiritualidade centrada na proximidade, na escuta e na compaixão. Defendeu uma pastoral que acolhe antes de julgar e que acompanha antes de exigir mudanças.

Seu chamado a uma “conversão pastoral” propôs uma Igreja menos burocrática e mais próxima das feridas humanas.

“Vejo a Igreja como um hospital de campanha depois de uma batalha.” (Entrevista ao jornal La Civiltà Cattolica, 2013).

A atenção às periferias existenciais — espirituais, sociais e culturais — redefiniu a missão evangelizadora no século XXI.

7. A humildade como marca pessoal

Desde seu primeiro gesto como papa — inclinando-se para pedir a bênção do povo reunido na Praça de São Pedro —, Francisco demonstrou que a verdadeira autoridade cristã se funda na humildade.

Optando por viver na Casa Santa Marta em vez dos aposentos papais, usando sapatos simples e recusando alguns símbolos, ele ensinou com a vida aquilo que pregava com palavras.

Sua frase emblemática continua a ecoar:

“Sou um pecador para quem o Senhor olhou” (Papa Francisco, entrevista à La Civiltà Cattolica, 2013).

8. A herança para o futuro da Igreja

O legado de Francisco é vasto e multifacetado: uma Igreja mais sinodal, missionária, misericordiosa e comprometida com o cuidado dos mais frágeis e do meio ambiente. Ele plantou sementes que continuarão a florescer nas próximas gerações.

Seus ensinamentos sobre sinodalidade — o caminhar juntos do Povo de Deus — estão moldando um novo modo de viver a fé e de exercer o governo eclesial.

9. Uma voz profética para além da Igreja

Francisco transcendeu os limites eclesiais, tornando-se uma das consciências morais mais respeitadas do século XXI.

Suas encíclicas — Laudato Si’ e Fratelli Tutti — são documentos de referência mundial, citados em assembleias da ONU, fóruns econômicos e encontros inter-religiosos.

Sua coragem em denunciar as injustiças e em clamar pela dignidade humana fez dele um líder admirado por crentes e não crentes.

10. Uma despedida cheia de esperança

Ao nos despedirmos de Papa Francisco, recordamos com gratidão sua vida doada por amor a Cristo e à humanidade.

Seus olhos cheios de compaixão, sua voz serena e firme, seus gestos de humildade e seu sorriso acolhedor continuarão a inspirar a Igreja e o mundo.

“A esperança é ousada, sabe olhar para além das comodidades pessoais, das pequenas seguranças e compensações que reduzem o horizonte, para se abrir aos grandes ideais que tornam a vida mais bela e digna”. (Fratelli Tutti, n. 55).

Com esperança, confiamos que este Pastor da Misericórdia agora contempla, face a face, o Senhor da Misericórdia, a quem serviu com tanto amor.

O eterno Pastor da Misericórdia

O Papa Francisco entrou para a história não apenas como o 266º Sucessor de Pedro, mas como um verdadeiro profeta da misericórdia, um reformador humilde e um amigo dos pobres. Seu legado espiritual será um farol para a Igreja peregrina, chamada a viver, como ele tantas vezes nos exortou, “a alegria do Evangelho”.

Em tempos de crises, de incertezas e de desafios para a fé cristã, a memória de Francisco permanece como um convite: sermos Igreja em saída, Igreja samaritana, Igreja misericordiosa.

Que o Espírito Santo continue a fazer frutificar a semente que ele plantou em nossos corações e em nossa história.

Thiago Zanetti

Por Thiago Zanetti
Jornalista, copywriter e escritor católico. Graduado em Jornalismo e Mestre em História Social das Relações Políticas, ambos pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). É autor dos livros Mensagens de Fé e Esperança (UICLAP, 2025), Deus é a resposta de nossas vidas (Palavra & Prece, 2012) e O Sagrado: prosas e versos (Flor & Cultura, 2012).
Acesse o Blog: www.thiagozanetti.com.br
Siga-o no Instagram: @thiagoz.escritor




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