Catecismo
A espiritualidade mariana no pontificado de Leão XIV
por Thiago Zanetti em 26/05/2025 • Você e mais 904 pessoas leram este artigo Comentar

Tempo de leitura: 6 minutos
No dia 10 de maio de 2025, apenas alguns dias após sua eleição, o Papa Leão XIV surpreendeu o mundo ao escolher como primeiro destino de peregrinação o santuário de Nossa Senhora do Bom Conselho, em Genazzano, na Itália. O gesto foi mais que simbólico: foi uma clara demonstração de sua espiritualidade profundamente mariana e da confiança que deposita na intercessão da Mãe de Deus.
A visita não apenas retomou uma antiga tradição de papas devotos de Maria, mas também reacendeu nos fiéis o interesse por uma das invocações mais ricas da Virgem: “Mãe do Bom Conselho”. Ao rezar diante da imagem milagrosa de Genazzano, Leão XIV revelou sua intenção de conduzir a Igreja sob a inspiração e o discernimento de Maria.
Uma devoção com raízes profundas
A devoção a Nossa Senhora do Bom Conselho surgiu no século XV, na cidade de Genazzano, quando uma imagem da Virgem, vinda milagrosamente da Albânia, apareceu na parede da igreja dos agostinianos. Desde então, o local tornou-se centro de peregrinação e oração por orientação divina.
O Papa Leão XIV, ele mesmo membro da Ordem de Santo Agostinho, já havia celebrado missas nesse santuário antes mesmo de sua eleição. Sua ligação com a Virgem do Bom Conselho é, portanto, pessoal e consolidada ao longo de sua vida espiritual.
A Igreja, ao longo dos séculos, reconheceu na Virgem Maria aquela que participa do mistério da salvação não como co-redentora, mas como colaboradora fiel do desígnio divino. Como afirma o Concílio Vaticano II:
“consideram com razão os santos Padres que Maria não foi utilizada por Deus como instrumento meramente passivo, mas que cooperou livremente, pela sua fé e obediência, na salvação dos homens. Como diz S. Ireneu, «obedecendo, ela tornou-se causa de salvação, para si e para todo o género humano» (176).” (Lumen Gentium, 56).
Maria como guia segura da Igreja
Ao escolher essa invocação específica, Leão XIV parece apontar para um modelo de governo que busca discernimento, prudência e docilidade à vontade de Deus — virtudes tradicionalmente associadas à figura da Mãe do Bom Conselho. Em tempos de desafios sociais, morais e doutrinais para a Igreja, o Papa mostra que deseja ser conduzido não apenas pela razão ou pela política eclesiástica, mas pela escuta do Espírito, como Maria fez.
Como destaca São João Paulo II na carta encíclica Redemptoris Mater:
“A Deus que revela é devida a obediência da fé (Rom 16, 26; cf. Rom 1, 5; 2 Cor 10, 5-6), pela qual o homem se entrega total e livremente a Deus… Exatamente esta descrição da fé teve em Maria uma atuação perfeita. Na Anunciação, de fato, Maria entregou-se a Deus completamente, manifestando a obediência da fé Àquele que lhe falava, mediante o seu mensageiro, prestando-lhe o obséquio pleno da inteligência e da vontade. Ela respondeu, pois, com todo o seu eu humano e feminino.” (RM, 13).
Ao tomar Maria como referência, Leão XIV se ancora na confiança de que o discernimento verdadeiro nasce da escuta e da humildade. E a figura da Virgem do Bom Conselho justamente evoca isso: o lugar de silêncio interior onde Deus fala e guia.
A missão petrina iluminada pela Mãe do Bom Conselho
O Papa é, por vocação, aquele que confirma os irmãos na fé (cf. Lc 22,32) e conduz o rebanho de Cristo com sabedoria e coragem. Essa missão, tão elevada quanto exigente, precisa ser sustentada por profunda vida de oração e discernimento constante. E é justamente neste ponto que Maria, como Mãe do Bom Conselho, oferece um exemplo luminoso.
O Papa Paulo VI, grande devoto de Maria, declarou que Maria é:
“modelo excelentíssimo da Igreja, na ordem da fé, da caridade e da perfeita união com Cristo” (Marialis Cultus, 16).
Para Leão XIV, essa união não é apenas modelo, mas caminho. Ele encontra em Maria não apenas inspiração pessoal, mas critério para seu pontificado. A imagem de Maria que aconselha, orienta e guarda é também imagem da Igreja que escuta antes de falar, que se deixa guiar antes de guiar.
Essa espiritualidade tem fortes raízes patrísticas. Santo Ambrósio, por exemplo, ao comentar o episódio da Anunciação, afirma:
“Aprende, ó alma fiel, a pureza do corpo e da alma, aprende a humildade, aprende da Virgem a fé” (Expositio Evangelii secundum Lucam, II, 17).
A devoção que forma o coração dos pastores
A espiritualidade mariana de Leão XIV também fala aos pastores da Igreja. Em tempos de polarizações internas, crises vocacionais e desafios evangelizadores, a figura da Mãe do Bom Conselho surge como modelo de docilidade, sabedoria e escuta.
O Catecismo da Igreja Católica ensina que:
“Maria respondeu com ‘obediêcia e fé, certa de que ‘nada é impossível a Deus’ (CIC, 494)
Por isso, um Papa que se deixa conduzir por Maria é também um Papa que deseja formar uma Igreja mais unida, mais dócil ao Espírito Santo e mais centrada no essencial: a escuta da Palavra, a fidelidade a Cristo e o serviço aos pobres.
Um chamado à confiança mariana dos fiéis
A escolha da devoção à Mãe do Bom Conselho também representa um convite aos fiéis do mundo inteiro a retomarem uma relação mais profunda com Maria. Em tempos de incertezas, muitos buscam conselhos em psicólogos, redes sociais ou gurus. Mas Maria é apresentada pela tradição da Igreja como a “Sede da Sabedoria” e a “Conselheira dos Aflitos”.
Como afirma o Papa Bento XVI:
“Tudo na Igreja, qualquer instituição e ministério, também o de Pedro e dos seus sucessores, está ‘incluído’ sob o manto da Virgem, no espaço pleno da graça do seu ‘sim’ à vontade de Deus.” (Homilia, 25/03/2006).
Diante de tantas vozes que competem por nossa atenção, a devoção à Mãe do Bom Conselho convida os cristãos a retomarem a escuta interior, a oração silenciosa e o discernimento fiel, confiando que Deus guia os seus filhos através da maternidade espiritual de Maria.
Sob o olhar da Mãe do Bom Conselho
O início do pontificado de Leão XIV sob o olhar da Virgem de Genazzano revela não apenas uma preferência pessoal, mas uma visão pastoral clara: a Igreja precisa reencontrar na sabedoria de Maria o caminho da unidade, do discernimento e da fidelidade ao Evangelho. Em sua oração diante da imagem milagrosa, Leão XIV consagrou sua missão petrina àquela que “guardava todas estas coisas, meditando-as no seu coração” (Lc 2,19).
Assim como outrora os apóstolos “perseveravam unânimes na oração com Maria, mãe de Jesus” (At 1,14), o novo Papa dá o tom de seu governo: uma Igreja que escuta, discerne e age sob o conselho da Mãe. Que esse gesto inspire a todos os cristãos a retomarem com fervor a devoção mariana, certos de que Maria continua, do Céu, a repetir suas palavras de Caná: “Fazei tudo o que Ele vos disser!” (Jo 2,5).
Gostou do artigo? Então assista à pregação abaixo:

Por Thiago Zanetti
Jornalista, copywriter e escritor católico. Graduado em Jornalismo e Mestre em História Social das Relações Políticas, ambos pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). É autor dos livros Mensagens de Fé e Esperança (UICLAP, 2025), Deus é a resposta de nossas vidas (Palavra & Prece, 2012) e O Sagrado: prosas e versos (Flor & Cultura, 2012).
Acesse o Blog: www.thiagozanetti.com.br
Siga-o no Instagram: @thiagoz.escritor
Compartilhar:
Voltar para artigos