Namoro
Carência não é vocação: aprendendo a esperar sem desespero
por Thiago Zanetti em 10/11/2025 • Você e mais 78 pessoas leram este artigo Comentar
Vivemos em uma época em que tudo parece urgente. A vida moderna nos acostumou com a pressa, com a resposta imediata, com a ilusão de que o amor verdadeiro é algo que se encontra deslizando o dedo na tela do celular. Nesse cenário, a carência se disfarça facilmente de vocação, e muitos acabam confundindo o desejo de amar com a necessidade de preencher um vazio. Mas a carência não é vocação. E aprender a esperar sem desespero é um dos maiores atos de maturidade espiritual e emocional que alguém pode viver.
O coração inquieto e a falsa urgência do amor
Santo Agostinho escreveu: “Fizeste-nos para Ti, Senhor, e inquieto está o nosso coração enquanto não repousa em Ti” (Confissões, I, 1, 1). Essa frase revela uma verdade profunda: a inquietação que sentimos nem sempre é falta de alguém, mas saudade de Deus. Quando não entendemos isso, projetamos nos outros a tarefa impossível de preencher o que só o Criador pode saciar.
A carência nasce dessa desordem interior, quando colocamos o amor humano acima do amor divino. O problema não é desejar amar e ser amado, mas buscar isso de modo desesperado, acreditando que a felicidade depende da presença de outra pessoa. Esse tipo de busca transforma o outro em ídolo — e o coração idólatra nunca descansa.
Esperar não é perder tempo
Esperar é, muitas vezes, o contrário da passividade. É uma escolha ativa de confiar. No livro do profeta Isaías lemos: “Mas os que esperam no Senhor renovam suas forças, criam asas como águias, correm e não se afadigam, andam, andam e nunca se cansam” (Is 40,31).
Esperar, à luz da fé, é caminhar no tempo de Deus, e não no tempo da ansiedade. É permitir que Ele prepare o coração — e também o tempo — para o encontro certo. Há esperas que formam, moldam, purificam. São períodos de silêncio e crescimento interior, nos quais aprendemos a amar de modo mais livre e consciente.
Quem não sabe esperar, muitas vezes escolhe mal. Apressa-se, aceita migalhas, confunde atenção com amor, companhia com vocação. Mas quem aprende a esperar entende que o amor verdadeiro não é fruto da carência, e sim da comunhão entre duas almas que encontraram antes a plenitude em Deus.
A diferença entre vocação e carência
A vocação é um chamado.
A carência, uma reação.
A vocação brota da liberdade, da escuta, da maturidade. A carência nasce da falta, da pressa e do medo.
A pessoa vocacionada ao matrimônio, por exemplo, não busca o outro para se completar, mas para se doar. O amor maduro é fecundo porque transborda, não porque implora.
São João Paulo II, ao refletir sobre o amor humano, dizia:
“O homem não pode viver sem amor. Ele permanece para si próprio um ser incompreensível e a sua vida é destituída de sentido, se não lhe for revelado o amor, se ele não se encontra com o amor, se o não experimenta e se o não torna algo seu próprio, se nele não participa vivamente.” (Redemptor Hominis, 10).
O problema é que, sem compreender o amor na sua origem — Deus —, acabamos buscando sentido em relações que apenas espelham a nossa falta. A vocação é resposta ao amor divino. A carência é grito de um coração que ainda não o reconheceu.
A espera como tempo de amadurecimento
A espera é um tempo fértil. É nela que Deus trabalha no invisível. Enquanto parece que nada acontece, o Senhor age silenciosamente, preparando caminhos, curando feridas, moldando a alma.
Santa Teresa de Ávila dizia: “Nada te perturbe, nada te espante. Tudo passa, Deus não muda. A paciência tudo alcança.” Essa paciência não é apatia, mas perseverança. É saber que o tempo de Deus é sempre o melhor — mesmo quando Ele parece demorar.
O desespero, ao contrário, é filho da impaciência. Ele cega, distorce e aprisiona. A pessoa desesperada se torna escrava da necessidade de resolver tudo agora, sem perceber que o amor que vem de Deus nunca nasce do impulso, mas da fidelidade.
O perigo da idealização
Quando a carência comanda, idealizamos. Criamos uma versão imaginária do outro, um “salvador” emocional que vai curar nossas feridas. Mas ninguém pode ocupar esse lugar. Quando o amor é construído sobre a idealização, ele se torna frágil — basta o primeiro atrito para que tudo desmorone.
Esperar sem desespero é também aprender a ver o outro como ele é, e não como gostaríamos que fosse. É aceitar a realidade com gratidão e discernir com serenidade o que vem de Deus e o que nasce apenas do nosso desejo.
O valor do tempo de solteirice
O tempo de solteiro não é castigo, mas um período de lapidação. É quando aprendemos a nos conhecer, a crescer espiritualmente, a servir, a amar a Deus com inteireza. É o tempo de cultivar a amizade, de amadurecer emocionalmente, de construir uma vida sólida antes de compartilhá-la com alguém.
Como diz o Salmo 37,4: “Põe tuas delícias no Senhor, e os desejos do teu coração ele atenderá.” Ou seja, quando o coração se ordena em Deus, os desejos se tornam puros e o amor se torna vocação, não carência.
Esperar é confiar no Amor
A verdadeira espera é um ato de fé. Não é “ficar parado”, mas colocar o coração em movimento — rumo a Deus. É aprender a amar antes de ser amado, a servir antes de ser escolhido, a doar antes de receber.
A carência diz: “Preciso de alguém agora.”
A fé responde: “Deus sabe o tempo certo.”
Quando confiamos, o medo dá lugar à paz. E, muitas vezes, é justamente nesse estado de serenidade que o amor acontece — não como fuga da solidão, mas como encontro de duas liberdades que escolheram amar no tempo de Deus.
Quando o amor amadurece
A carência é barulhenta, impaciente e cega. A vocação é silenciosa, confiante e livre. Aprender a esperar sem desespero é, na verdade, aprender a amar com sabedoria.
Não há solidão maior do que estar com alguém apenas para não ficar só. O amor verdadeiro é fruto de maturidade espiritual, de confiança e de entrega. E quem se deixa conduzir por Deus descobre que o tempo dEle nunca atrasa.
“Espera no Senhor e faze o bem; habitará a terra em plena segurança” (Sl 37,3).
A carência passa, o desespero se acalma, e o coração, enfim, encontra descanso — não quando alguém chega, mas quando Deus é o primeiro a ser amado.
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Este vídeo e o artigo para leitura complementar fazem parte da série “Namoro Católico: Em busca do meu José e da minha Maria”, publicada no canal do YouTube de Thiago Zanetti. Clique aqui para acessar o canal.

Por Thiago Zanetti
Jornalista, copywriter e escritor católico. Graduado em Jornalismo e Mestre em História Social das Relações Políticas, ambos pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). É autor dos livros Mensagens de Fé e Esperança (UICLAP, 2025), Deus é a resposta de nossas vidas (Palavra & Prece, 2012) e O Sagrado: prosas e versos (Flor & Cultura, 2012).
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